Seguindo as obrigações do seminário que fizemos e que vocês, leitores não-alunos, não viram. Recebemos três perguntas realizadas por três dos grupos que também fazem blogs de bioquímica (e que podem ser visitados aí do lado esquerdo). Tentamos responder todas com pesquisa e com tudo que nós sabemos e aí vão as respostas:
1) Já que uma das funções do fígado é manter a glicemia, a deposição de colesterol neste afeta de alguma forma a gliconeogênese? (by group Bioquímica do Álcool)
A biossíntese do colesterol é regulada, DENTRE OUTRAS COISAS, pela concentração do colesterol intracelular.
Altas concentrações de um esterol não identificado (talvez o colesterol ou um derivado dele) promovem a degradação da enzima acetil-CoA redutase (já citada em nosso blog e no seminário) e a inibição na transcrição do seu gene.
Altas concentrações de colesterol intracelular ativam a ação da ACAT (enzima ail-CoA-colesterol aciltransferase, responsável pela formação de ésteres de colesterol), o que faz aumentar a esterificação do colesterol para o ARMAZENAMENTO. Os ésteres de colesterol são armazenados no fígado ou transportados inseridos em partículas lipoproteicas para outros tecidos que empregam colesterol.
Mas, altas concentrações de colesterol intracelular também diminuem a transcrição do gene que codifica o receptor da LDL, o que reduz a produção do receptor e a consequente captação do colesterol pelo sangue.
Dessa forma, entendemos que, quando a quantidade de colesterol sintetizada ou obtida na dieta excede o necessário pra satisfazer a síntese das membranas, dos sais biliares e esteróides, pode ocorrer acúmulo de colesterol NAS PAREDES DOS VASOS SANGUÍNEOS, e não no fígado.
Em humanos, a estrutura cíclica do colesterol não pode ser degradada. Dessa forma, o núcleo esteróide é eliminado intacto pela conversão em ácidos e sais biliares.
Enfim, quando ocorre aumento do colesterol nas células hepáticas, ou a produção desse esteróide é inibida, ou a sua excreção na bile é aumentada. O quadro que poderia afetar a gliconeogênese e outras funções hepáticas é conhecido como ESTEATOSE HEPÁTICA (acúmulo de lipídeos no fígado). Esses lipídeos, porém, são de várias outras classes de lipídeos, que não a dos esteróides, classe em que se encontra o colesterol.
Dessa forma altos índices de colesterol podem ser considerados um indicativo da possibilidade de esteatose e não uma razão para sua existência, uma vez que altos níveis de lipídeos requerem uma maior quantidade de colesterol para a formação das lipoproteínas de transporte.
2) O colesterol exógeno impede a produção de colesterol endógeno. Por que isso acontece? (by group Bioquímica dos Radicais Livres)
No texto da primeira resposta já demonstramos o caminho da produção do colesterol.
Recapitulando: Quando o colesterol é absorvido em grandes quantidades pelo fígado, sua alta concentração intracelular promove a degradação da enzima acetil-CoA redutase, aquela mesma que é responsável por uma das etapas da síntese de colesterol endógeno.
Dessa forma, quando o indivíduo ingere grandes quantidades de colesterol e o fígado consegue absorver esse lipídeo apropriadamente, sua concentração impede a síntese de colesterol endógeno, fazendo exatamente o que foi perguntado: usando o colesterol exógeno para impedir a síntese de colesterol endógeno.
Esse é o motivo pelo qual dissemos no nosso seminário e no meu post sobre dietas, que a ingestão de colesterol tem um papel muito pequeno nos quadros de acúmulo do próprio no corpo. Um organismo equilibrado e saudável consegue neutralizar ingestões de colesterol facilmente pelo controle de sua síntese através desse mecanismo.
A importância desse mecanismo no corpo é imensa. Impedindo a síntese excessiva de colesterol o organismo impede várias doenças como a aterosclerose (mostrada por mim no seminário e pelo Jean no blog), que se caracteriza pelo excesso de colesterol nos vasos sanguíneos. É importante destacar que essa síntese é extremamente sensível e funcional, dada a enorme importância do colesterol para o funcionamento do corpo, como foi mostrado pelo Carlos e pelo Arthur no seminário e como pode ser visto em vários posts do blog.
3) Qual é a alteração que existe na síntese de colesterol em indivíduos que são hipercolesterolêmicos pela produção de colesterol endógeno e não por fatores exógenos, como a má alimentação? (by group Bioquímica do Exercício)
Bom. Existem várias possibilidades para a hipercolesterolemia. Primeiramente é importante destacar que a hipercolesterolemia tende a ser quase sempre causada pelo colesterol endógeno. Mesmo quando causada pela má-alimentação.
Deixa eu tentar explicar isso. Uma dieta com quantidades excessivas de gorduras saturadas, por exemplo, apesar de ser causada pela má-alimentação, tende a aumentar a produção de colesterol endógeno. Isso acontece pois esse tipo de gordura inibe a detecção de altos níveis de colesterol pelo fígado que acaba por produzir mais e mais colesterol.
Quanto ao aumento de colesterol não relacionado a alimentação de forma alguma podemos tratar principalmente de uma doença chamada Hipercolesterolemia familiar (repita 5 veses bem rápido!). Essa doença representa o maior fator genético para o acúmulo de colesterol e caracteriza-se por uma deficiência no gene que codifica o receptor para a LDL no fígado. Com a falta desse receptor o organismo não consegue retirar a LDL no sangue e o fígado não consegue inibir apropriadamente a síntese de mais colesterol, o que acaba por causar acúmulo dele no plasma a níveis que podem ser incríveis dependendo do nível de deficiência do gene. Existem casos que o colesterol chegou a estar 5 veses maior que o máximo recomendado.
Há também doenças relacionadas a problemas na síntese de HDL, aquela lipoproteína que mostramos ser importante para retirar colesterol do plasma e levá-lo para o fígado onde pode ser excretado. Tais casos também causam hipercolesterolemia sem nenhuma influência alimentar. Sua importância é menor que a da Hipercolesterolemia familiar, pois se trata de uma doença muito mais rara que a primeira.
A deficiência de HDL genética pode se relacionar ao hipercatabolismo de da apoA-I e apoA-II maduras, as apolipoproteínas principais na constituição do HDL. Em casos ainda mais graves, as apolipoproteínas maduras e também seus precursores são degradados de forma muito intensa pelo organismo. Esse último caso caracteriza a doença de Tangier, que é ainda mais rara.
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